O Maestro Dámaso González (q.e.p.d.) disse que “o aficionado precisa de um animal feroz, porque, caso contrário, não valoriza o que o toureiro faz”

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TRIBUNA da TAUROMAQUIA
+ Texto : Dra. ESTER TERENO
+ Fotos : D. R. - 

TRIUNFO DOS DESLUMBRADOS


Eu que gosto tanto de escrever sobre coisas bonitas, mas vocês, sinceramente, não colaboram nada... Vocês, nós, eu, todos! Sempre detestei a conversa fatalista de tantos “mal vai a festa”, agora, já não sei bem. Não seria suposto “apenas” focarmo-nos nos ataques de fora, que já não são assim tão desprezíveis? 


Primeiro, foi a história de ser a Onetoro a transmitir as corridas do Campo Pequeno, porque não era uma portuguesa, etc. Que eu saiba, nenhuma televisão estatal (tirando as autonómicas em Espanha, mas isso é outra conversa), transmitem. E há quantos anos deixou a RTP de transmitir? Alguém de direito, (sim, que não era eu ou o Sr. Manuel da mercearia que apenas pagamos bilhetes, que tínhamos força ou peso para o fazer) se mexeu convenientemente na altura? Não me parece. Se nem com o aumento do gasóleo ou azeite nos mexemos... 


Mais, porque se permite a ditadura de alguns mais influentes, que impõem touros sem raça nem bravura? Por que enganam o público com tanta falta de vergonha e desprezo?

O touro que as figuras hoje lidam quase nunca garante a emoção inerente à festa. Diz-se que o público mudou, mas muitos aficionados à séria foram embora, expulsos, fartos de tantas fraudes. 

O Maestro Dámaso González disse que “o aficionado precisa de um animal feroz, porque, caso contrário, não valoriza o que o toureiro faz”. E Victorino Martín Sr. proclamou que “O maior cancro nas touradas é fazer com que o touro não incomode; a coragem exige, incomoda e faz suar.” Não sei se há muitos a saberem muito mais que estes dois Senhores...


Porque será que o gosto pelas festas populares está a aumentar? A emoção deve ter algo a ver com isso, presumo eu que nunca me quis meter em nada destas conversas. 

Por falar na emoção, como não falar do pequeno grande Tomás Bastos? Que a sorte o acompanhe sempre e o proteja de tudo o resto. Lá está, uns querem muito ser, outros já nascem.


Depois chegam as comemorações, e bem, a que vai acontecer do “nosso” João Pedro “Açoreano”, sim, porque para celebrar carreiras, a pulso, tem que se ter mérito, e muito. E não o dos esquemas e favores, o mérito, apenas por ele só. Nunca se viu tanto artifício e ambição desmedida, zero meritocracia, o que interessa é brilhar. Se calhar estou ultrapassada. E juntando a merecidíssima homenagem ao saudoso Mestre Joaquim Bastinhas.

E tantos outros que mereciam, celebrações, homenagens, o que fosse! E em vida! Já diz o grande “cantaor” José Mercé, que as homenagens devem ser todas feitas em vida, senão, como desfruta o homenageado?


Mais, o fenómeno do sair antes de terminarem as corridas (ai jesus que vou apanhar muito trânsito à saída), mais o corre-corre para o bar entretanto, e treinadores de bancada aos gritos. Não sei bem... 

Uma das grandes conquistas dos tempos modernos é a individualidade que quando pensa, pode ser arrebatadora, quando não pensa, é só mal-educada, e agora pensem vocês.


Estaremos a baixar o denominador comum e os parâmetros da qualidade? Até porque já sabemos que o bom gosto, muito menos a modernidade, provêm da maioria. Que premeia, mais do que o talento ou o trabalho, os fascinados deste mundo que fizeram de tudo para lá chegar. 

Tudo e todos nivelados por baixo. Nem tudo o que é novo é necessariamente um avanço social. 

Agora todos querem parecer diferentes só que se esquecem que sem conteúdo não há verdadeira originalidade. Já nem uma piada se pode atirar, só pela graça infantil de se poder ser parvo. Há sempre um moralista, um treinador de bancada, alguém que se benze e encontra uma ponta de maldade no que se diz sem maldade nenhuma. O chamado tribunal da santa inquisição dita progressista.

Vive-se um novo moralismo que é uma forma de pôr de parte todos os que não pensam como a maioria. Mais uma vez. Mata-se o diálogo e a diferença de opiniões, como se houvesse uma verdade suprema superior. 

Bom bom, é não ter opinião, pois tal como acontece com o colesterol, depende: há aquelas que são essenciais para a vida, há aquelas que podem matá-la. E esse é o problema que temos hoje: temos cada vez menos consenso sobre o primeiro tipo de opinião (colesterol bom). Enquanto, por sua vez, tentam-nos impor opiniões cada vez mais prejudiciais (colesterol mau). 

Porque, no fundo, o perfeito seria a obrigação moral para não discordar muito. Aceitar o que a maioria diz. 

Mas não temos todos que estar sempre acordo, a discrepância é educativa, mesmo que se pense diferente, mas os mal-intencionados e os tontos não contribuem em nada. Principalmente os tontos.


E que bom que foi ver que alguns ficaram constrangidos com a presença de Carlos Alcaraz na praça de touros de Múrcia. Atribuíram ao tenista o erro imperdoável de ter se tornado cúmplice da tortura. Um ídolo de massas decepcionou aqueles que o vêm como um modelo social, especialmente entre os jovens. Por favor, como se ele tivesse sido apanhado em flagrante durante um crime, ir aos touros agora é quase como um desporto radical! 


E um bom exemplo de boa educação, ou melhor, da falta dela, gritaram a Morante de la Puebla “Estás muito gordo!” numa corrida em Bilbao, mas isto é o quê? Ah, e não havia nenhum “vigilante gordofóbico” por perto, para penalizar tamanha discriminação. Podia ser só violência estética, mas não.

Morante é um toureiro fora da “norma” em todas as suas facetas, nas suas lides, na sua forma de vestir. Seja como for, é de esperar que o público mantenha um mínimo de educação e se comporte nas corridas. Espero que se redescubram os padrões de conduta com os quais uma pessoa se comporta de maneira considerada correcta e mantém certas formas como sinal de respeito pelo outro. Respeito, leram bem!

Felizmente, já há pessoas a perceber que a etiqueta não é uma ferramenta de distinção de classe, mas uma forma de proteger as pessoas de comportamentos incorrectos. 

Logo eu que acho que um toureiro nunca deve ser ofendido, pois representa uma figura quase divina, respeitada porque arrisca a vida e por permanecer inalterável, intocável, como um semideus inatingível pelas ofensas. A sua postura heroica, é a precursora dos heróis, não de “ofendiditos”. 


Faço daqui um apelo, por favor ajudem-me, a ver se na próxima crónica consigo falar de coisas mais interessantes do que a falta de respeito generalizada.