tribuna da tauromaquia

Importante artículo de un acreditado biólogo, José Manuel Marques, en el "NOVO Semanário". Atención a los muchos e importantes argumentos que utiliza en este escrito que acaba de ver la luz en el fin de semana en Portugal.
Dice :

Idade mínima das touradas

Em que se aprende a distinguir uma coruja de um mocho e qual a importância dos predadores, e qual a razão por que as monoculturas são negativas para a biodiversidade.

Não sou aficionado. Juro que não me lembro de ter entrado numa praça de toiros, embora gostasse de ver as corridas entrarem na minha casa, noite dentro, pelo ecrã da TV. Todavia, aprendi a gostar de toiros e toiradas quando percorria as lezírias do Tejo, durante os muitos anos que trabalhei como biólogo do Instituto de Conservação da Natureza. Vi campinos a fazerem nas lezírias as proezas que os cavaleiros tauromáquicos desenvolvem nas praças e também me habituei a ver nas pequenas e negras manadas de toiros os guardiões perfeitos da biodiversidade.

Onde estão os toiros não está a caça. Ali, as populações de coelhos são sadias, as lebres exibem-se descontraídas e as perdizes e codornizes saltam a esmo das moitas, sabendo que apenas se devem resguardar das aladas investidas dos predadores. Águias e falcões, corujas e mochos encontram nas pastagens dos toiros os melhores terrenos de caça. E, meu Deus, é tão inebriante o cheiro que sai daqueles pastos que o Paraíso pré-Adão até poderia ter o jeito das lezírias do Tejo, com o gado de lide por lá andando, sacudindo as moscas que saciam bandos e bandos de aves canoras. No olhar negro do toiro refugia-se uma das maiores biodiversidades de Portugal.

O dia em que, por fatalidade, acabarem as toiradas será o dia em que o gado de lide passará a ser conservado apenas como reserva semental de património genético. Então, os muitos milhares de hectares por onde andam os toiros ficarão à mercê das monoculturas intensivas ou das encantadoras estufas de plástico, como as que Inês de Sousa Real tem e que ela diz serem ecológicas. Se, um dia, isso suceder, o fado cantará mais pobre, sem o Ramalhete de Alcochete e sem o Cavalo Ruço, herdado de Viriato e fecundado pelo vento.

Mas algo mais se perderá. A corrida à portuguesa é uma metáfora de Portugal e da sua cultura de combate. Uma cultura construída ao longo de muitos séculos de afrontamento do pequeno contra o grande e do fraco contra o forte. Uma cultura que riscou, a sangue, a mais antiga linha de fronteira da Europa, e talvez do mundo, e que definiu um país marítimo, cuja fronteira interior vai até onde ia então o limite de navegabilidade dos rios portugueses.

Foi essa cultura de resiliência, rusticidade e combate que levou a que um pequeno povo, com pouco mais de um milhão de almas, chegasse a todos os recantos do mundo e interpretasse na sua língua os novos e variados fenómenos que a humanidade ia descobrindo, mar afora ou mar adentro, conforme a perspectiva. Foi essa cultura que permitiu que a língua portuguesa se estendesse como cobertor pelos vários continentes, marcando indelevelmente os locais por onde os portugueses passavam.

Quando o grupo de forcados salta para a arena, ao tom da corneta, o toiro, agora, é o adversário e a ideia é pará-lo. Pegá-lo pelos cornos, como se diz em bom português. E é o povo, representado no grupo de forcados, que o faz. Nas mãos do povo não há espadas, nem lanças, nem paus, nem farpas. Não têm dinheiro para armas e menos ainda para armar cavalos. As mãos rijas levam apenas a vontade de pegar o toiro e de o parar. E como consegue um peão parar um toiro? Com embuste, claro.

Primeiro há que tirar o adversário da sua zona de conforto e posicioná-lo. É a escolha do campo, o campo de combate. Assim o fez Nuno Álvares em Aljubarrota. Depois vai-se para a luta como quem vai para uma festa. Barrete na cabeça, bem enfiado ,e ginga-se a cintura, de mãos nas ancas, num desafio de fandango, gritando olés ao toiro, que é lindo. Olés, como os portugueses gritaram frente ao invasor francês: “Allez, allez, à votre santé!” E foi o povo que sem exército fez parar a primeira invasão. E o toiro fixa-se no forcado da frente, o cabo. Atrás vêm perfilados os restantes sete. Provoca-se o inimigo acenando e colocando à sua disposição um alvo fraco - é importante que o adversário acredite que a iniciativa é sua. “Ah, toiro lindo! Anda cá, toiro!”, atira-lhe o franzino cabo de forcados, como outrora a padeira de Aljubarrota atirou pães aos castelhanos.

O toiro, uma massa muscular de 400 a 600 kg, investe com crença, acreditando que o alvo é fácil. O homem da frente finge tranquilidade, sabendo que, na melhor das hipóteses, acordará no dia seguinte cheio de dores e com nódoas negras em todas as esquinas do corpo. O toiro, cego pelo forcado que se lhe alapa na cornadura, é subitamente rodeado pelos restantes sete forcados - as ajudas, como se diz. Ninguém larga. Ninguém cede. Ninguém foge. O inimigo tem de ser parado.




PARA SEGUIR, PARA LER NA TOTALIDADE ESTE 

ARTIGO VOCÊ DEVE FAZER CLICK AQUÍ