ANTÓNIO FERRERA :

UM REGRESSO COMO FIGURA DO TOUREIO

Por Luís Capucha *

António Ferrera toureou em Arruda e está anunciado para outras duas corridas em Portugal. Mais à frente este ano está anunciado para uma “encerrona” com seis toiros de Adolfo Martin na importante Feria de Otoño na Monumental de Las Ventas em Madrid. 

Quem vem tourear em Arruda dos Vinhos, Arronches e Idanha-a-Nova é uma indiscutível figura do toureio, um dos “diestros” mais interessantes e mais importantes do atual “escalafón” da arte de Montes. E não vem num momento de decadência. Com os seus 43 anos de idade, está num momento cume da trajetória como figura do toureio. 

Dizem alguns nos mentideiros que vem para se preparar, a baixo custo, para o encontro madrileno com os adolfos martin. Outros que vem porque o empresário Simón Casas tem planos para Portugal e quer, com a viabilização destas apresentações, apalpar o terreno em terras lusas. 
Tenho para mim que quer uns, quer outros, são daqueles cínicos que, incapazes de sequer imaginar um gesto de grandeza, em tudo vêm calculismo. Eu, e com certeza a esmagadora maioria dos aficionados portugueses, acreditamos na explicação que nos foi dada pelo empresário Luís Miguel Pombeiro que conseguiu a proeza de o apresentar nos seus cartéis: António Ferrera quis vir agradecer a Portugal o que fez por ele quando era apenas “Antoñito Ferrera”. 

De facto, em miúdo pequeno, enquanto os meninos da sua idade estavam na escola, onde às vezes brincavam e ainda brincam aos toiros, ele tinha um sonho já muito claro: ser matador de toiros e figura do toureio. Por isso, na companhia do pai e de um velho bandarilheiro extremenho, crescia nos tentaderos das ganadarias portuguesas e em bezerradas que nessa altura proliferavam no Alentejo e no Ribatejo. 

Encontrei-o pela primeira vez em casa do Francisco Gregório, ganadaria onde matou a primeira bezerrita cuja cabeça exibia em casa dos pais. Depois coincidimos em inúmeras ganadarias, ele sempre com o pai e o seu mestre, eu com alunos da Escola de Toureio José Falcão. Eles organizavam bezerradas em Espanha para as quais convidavam os nossos alunos (principalmente o Bombita e o Choni) e nós organizávamos festejos do lado de cá, para os quais o convidávamos a ele. 

A foto que se junta testemunha esse intercâmbio. Com 11 anos, no dia 31 de dezembro de 1989, faz o passeio em Barrancos, junto com Luís Filipe à sua esquerda, e à direita David “Niño del Rio”, “Bombita” e Nuno Figueira. Atrás vêm Manuel dos Santos “Becas” e um outro jovem a quem peço desculpa por não reconhecer. 

Por cá fez, pois, o tirocínio como bezerrista e iniciou a carreira que o havia de projetar para o triunfo e a concretização do sonho ambicionado. É normal e é bonito que queira retribuir. E se com isso puder mostrar a quem tiver olhos para ver que o “país das touradas” só tem a ganhar com a corrida mista, tanto melhor. Terá saldado a dívida de gratidão, sentimento nobre, que o trouxe, já bem instalado no seu trono de figura (que não acomodado, porque isso não faz parte da sua tauromaquia sempre irreverente) de regresso até nós. E talvez, agora sonho eu, isso possa ajudar a que os fanáticos inimigos da festa não roubem os sonhos de grandeza às nossas crianças que continuam a brincar aos toiros.

Un jovencísimo Antoñito Ferrera, en el centro, dando la vuelta al ruedo ladeado por la francesa Elena Gayral y por el portugués Francisco Cortes. Es en la plaza de Estremoz y... ¡ya ha llovido!.

"...passeio em Barrancos, junto com Luís Filipe à sua esquerda, e à direita David “Niño del Rio”, “Bombita” e Nuno Figueira. Atrás vêm Manuel dos Santos “Becas”..."

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(*) : Drº Luís Capucha, autor de este artigo, é Sociólogo, professor associado e atual Diretor do Departamento de Ciência Política e Políticas Públicas do ISCTE-IUL e investigador do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia, desde 1987. Membro do Conselho Nacional de Educação.